Espadas da Guarda Nacional
O instrumento maior, de orgulho para um oficial
da Guarda Nacional, era sua espada, tal qual o cetro de um rei, a vara mágica
de um mago; a espada para aqueles homens personificam seu mando e seu prestígio
na sociedade.
Havia
em Barretos, um coronel da Guarda Nacional, que mesmo depois da extinção
daquela corporação, com muito orgulho e fidalguia, gostava de vestir a farda
azul, copiada dos oficiais do Exército francês, de botões dourados e quepe
vermelho, cingir à cinta a espada, no recesso do seu quarto, e passar muitas
horas da noite, sentado em uma poltrona, meditando o passado e lamentando no íntimo, a extinção daquele
brioso grupo de homens, que por tantos anos, decidiu a política, e com ela, os
destinos de nossa pátria.
Fechava a porta de seu quarto e a ninguém mais era permitida a entrada naquele
cômodo. Certa vez, um moço que era muito
impressionado com as coisas do sobrenatural, hospedou-se em sua casa. Errando
de porta, abriu sem querer, a do quarto do seu anfitrião. O que viu fez-lhe
gelar o sangue de suas veias.
O
velho coronel, espada em punho, agitando-a freneticamente, golpeava com ela o
vazio a torto e a direito, estocando o ar, numa coreografia maluca. O moço fechou
a porta rapidamente.
Na
manhã seguinte, na hora do café, não resistindo à curiosidade, perguntou ao
velho se ele era apaixonado por esgrima há muito tempo. O coronel, encarando-o
severo, respondeu: - vê-la seu sou apaixonado por esgrima. O que o senhor viu
abrindo a porta de meu quarto foi minha sessão de afastar os maus espíritos.
Todo
dia invoco os espíritos vagantes que vêm perambular em minha casa, e com o aço
e o fio de minha espada expulso-os pela janela afora. O moço engasgou-se o
pedaço de pão e levou um tempão para parar de tossir. Deu pressa e na mesma manhã o rapaz partiu.
Uma
filha do coronel comentou curiosa: - por que será que o Zeca, era o nome do
moço, deu tanta pressa em ir embora?
O
coronel, cofiando seus bigodes imensos,
cochichou-lhe, inventei a ele uma estória de espantar espíritos nos exercícios
que faço a noite de esgrima e ele caiu na mentira. Não gosto de ver hóspede
arrastando asas em volta de minhas filhas. Aquele coronel tinha sempre uma artimanha
escondida, para usar na hora certa. E ninguém ficou sabendo se ele espantava
espírito a espadadas, se era aficionado em esgrima ou se era um grande gozador.
Bié Junqueira Machione
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